segunda-feira, 19 de janeiro de 2009

Sala 4... quando e onde tudo começou

Interessante como as coisas acontecem nas nossas vidas. Num desses encontros casuais que a vida nos oferece, conheci Tatoo. Uma pessoa especial. Dotada de conhecimentos muitos, pessoa de lisura incontestável – isso dito pelos amigos de mais tempo.
Foi numa reunião em casa de amigos, regada a vinho e muita música, que conheci Tatoo. Ela havia vindo ao Rio para realizar um trabalho em uma Universidade. Conversamos muito sobre muitas coisas, entre elas a modificação dos hábitos de todos nós diante da aceleração das coisas que temos vivido dia-a-dia. Nessa conversa surgiu então um relato da Tatoo, sobre Salas de Bate-papo na internet. Eu lhe disse que tinha vontade de um dia entrar numa dessas salas pra ver como funciona, pois até então só conhecia o que algumas poucas pessoas me haviam dito. E, como isso não estava em primeiro plano nos meus projetos, ia passando, passando e nunca eu conhecia. Tatoo então revelou participar de uma dessas salas. Convidou-me a entrar na sala e conhecer o pessoal que freqüentava lá já há um tempo. Explicou-me que alguns que faziam parte desse grupo, de vez em quando se encontravam e estreitavam laços de amizades. Perguntei-lhe várias coisas a respeito para inteirar-me de como isso funcionava.
Era estranho para mim, acreditar que uma pessoa tão dedicada à pesquisa, pudesse freqüentar uma sala de bate-papo virtual. Mas..., era uma constatação também.

Ao chegar em casa liguei o notebook e resolvi entrar na sala que Tatoo havia indicado, mas como não conhecia ninguém, fiquei meio perdida com a velocidade da conversação. Parecia uma grande avenida no horário de rush. Saí da sala. Mas já que estava conectada, resolvi entrar em outras, não muitas. Logo depois saí da internet.

Passado alguns dias, resolvi voltar e tentar entrar na sala indicada por Tatoo. Assim que o fiz, procurei no canto direito da tela os nicknames para ver se encontrava o dela. Achei.
Eu havia entrado com o meu apelido de escola, quando ainda garota. Cliquei no nick da Tatoo e identifiquei-me. Ela fez uma festa, saiu apresentando-me para os demais nick’s que freqüentavam a sala com ela.
Nesse dia recebi muitas instruções sobre o funcionamento das salas e como ouvir músicas e colá-las na sala. Confesso, demorei a aprender. Mas todos foram gentis e muito pacientes comigo. Quando finalmente consegui colar minha primeira música, fiz o maior estardalhaço, que coisa mais interessante..., parecia criança brincando de apertar botões.

Durante pelo menos uns quase três meses eu freqüentei a Sala 4. Acabei conhecendo pessoalmente 03 pessoas do convívio virtual. Duas delas foram ao meu show com a Tatoo. Outra, conheci numa das minhas idas ao Município de onde, coincidentemente, ela era oriunda. Acabamos ficando mais próximas e trocando confidências, pois uma vez por semana, quando eu viajava para lá, marcávamos de almoçar juntas. Essa é Cotinha.

Começava então a minha jornada pelos chats, e, que viria depois despertar em mim o desejo de transformar em estudo para o curso que eu estava fazendo.

A Sala 4 durante um período foi um ambiente virtual muito gostoso de ser frequentado, mas começou a ter um movimento muito grande e nem sempre as pessoas que chegavam, tinham o cuidado das que eu conheci quando lá cheguei. Eu começava a ver uma transformação de público na sala. A frequência já não era a mesma e com a mesma cordialidade das pessoas de antes. Começava a ter na sala nicks de uma certa inconveniência que de certa forma incomodavam profundamente, pois eram insistentemente chatos, agressivos, abusivos na suas colocações e muitas vezes idiotas. Resolvi que não me interessava mais participar do convívio naquela sala.

Fiquei por umas duas ou três semanas sem entrar na sala. Mas aconteceu que certo dia, estando eu muito aborrecida e revendo meus conceitos, o primeiro lugar em que pensei ir, foi para sala de bate-papo. Neste momento dei uma parada e comecei a refletir sobre esse meu desejo. Por que uma sala de bate-papo e não uma pessoa no plano real para conversar e até mesmo desabafar? Qual a vantagem de estar numa sala de bate-papo num momento desses? Que tipo de conforto eu encontraria lá? Em quem eu poderia confiar a ponto de querer ir nesse momento pra lá? De quais coisas que me afligiam, eu poderia falar e com quem? – Comecei a perceber o porquê das salas cheias... Momentos de solidão. Momentos em que precisamos ter alguém por perto para contar até mesmo pequenas coisas que nos tiram do sério, ou contar coisas de tal importância, que necessitamos estar travestidos de outra personalidade (saindo de nós mesmos) para ter coragem de falar, contar, escrever até o mais íntimo dos pensamentos. Fiquei questionando esse meu comportamento e comparando-o ao comportamento dos jovens que enchem as lan house. Aliás, não somente os jovens freqüentam as “lan” – hoje elas fazem parte da vida de muitos adultos também.
Fiquei pensando que o fato de não conseguirmos nos livrar de determinados abismos existentes em nós mesmos, nos deixa meio sem rumo. E, não querendo ferir as crenças e credos de ninguém (longe disso), penso hoje, que as redes de comunicações existentes em chats, fazem o papel de confissionários eletrônicos. Faz acreditar que transpor de uma margem à outra (real/irreal), não oferece riscos maiores dos realmente existentes. O não saber aquilo que de certa forma não podemos ver face a face facilita a convivência com o mundo virtual. Tira de quaisquer um de nós a responsabilidade do daqui a pouco. Desse compromisso com essa coisa chamada futuro, que mexe com tudo em nós. Estar desvinculado de afetos e responsabilidades com as pessoas no plano real exerce um fascínio que se justifica pela falta de tempo entre convivências neste plano. E, portanto a virtualidade faz o seu papel neste momento.

Tem momentos que a expectativa é quem dá as cartas. Nada pior. A expectativa direcionando nossas vidas... Na virtualidade, tudo é expectativa. Mas, nada comprova ou reafirma condutas e/ou possibilidades. Esse descompromisso com o que temos no plano irreal é o que leva tanta gente às salas. Poder falar abertamente sobre coisas, fatos, anseios e brincar com o imaginário faz do homem atual um ser cuja virtualidade atende perfeitamente suas buscas.

Como Educadora, direcionei meus pensamentos aos garotos, que não encontrando respostas às suas necessidades dentro de um mundo tão desconectado em seus valores, fazem do virtual sua realidade. Um campo de ilusões que no momento em que se dá, tem a mesma força e intensidade das emoções vividas no plano real. Às vezes, um grande perigo.

Eu fiquei por muito tempo refletindo sobre. Pensei no quanto de solidão se resolve ligando apenas um ou dois botões, no máximo. Em quantas pessoas deveriam estar naquele momento precisando saber de outras com os mesmos intentos. Em quantas outras estariam buscando encontrar umas às outras, numa ilusão própria da característica humana, quando se fala em ter alguém que nos escute. Meu Deus!... Como somos frágeis. Como nada sabemos de nós mesmos. Como ainda necessitamos do colo da infância, para nos resguardar dos horrores da noite e nos redimir das travessuras tantas de todos os dias.
Esse desconhecido em nós, além de exercer um fascínio (pelo menos em pessoas como eu) sobre tudo que pensamos ser, nos amedronta, às vezes. É nessas vezes que esse estranho que habita em nós surge, nos leva às atitudes mais complexas ou ininteligíveis ou apenas solitárias.
A partir de todos estes questionamentos, fiquei numa dúvida entre ir à sala de bate-papo ou ligar para uma ou um amigo. Dei algumas voltas entre a sala e o quarto – no meu apartamento (nos seus poucos mts quadrados, uns 50...), e resolvi entrar na sala de bate-papo. Lá, fui saudada por todos. Cresceu uma satisfação inexplicável dentro de mim. Dali por diante, muitas conversas e muita música.
Neste dia aconteceu um episódio interessante, um nick feminino pediu a minha atenção, começamos a conversar e passou pela minha observação tratar-se de uma criança – pelas coisas que escrevia e pela forma como queria todo o tempo que ficasse conversando apenas com ela. Mas, tudo pode ser num espaço desses. Então chamei a atenção da Tatoo e das demais pessoas da sala para ver se eu estava ou não com razão – afinal elas tinham muito mais tempo e experiência de salas. Para minha surpresa, todas concordavam com a minha observação. Resolvi empreender na conversação com esse “nick bebê”. Era “Juju”, um encanto. Demorava a escrever uma frase, que vinha cheia de erros ortográficos bem naturais de uma criança em processo de construção da escrita. Fazia perguntas sobre minha vida e contava sobre a dela. Em certo momento, perguntei-lhe onde estudava, a resposta me fez rir: “Estudo na Universidade Rural e faço medicina. Estou terminando, vou ser veterinária.”
Continuei a conversa e perguntei-lhe se a mãe dela sabia que àquela hora ela estava conectada à internet e conversando numa sala de bate-papo com pessoas adultas? Ela então ficou muito brava comigo, começou a fazer malcriação – dessas que crianças fazem quando são contrariadas. Dizia-me “... que que você tem com isso? Num sô sua filha. Você é muito, muito chata mesmo. Eu quero ser sua amiga e você num quer. Só vim aqui pra fazer amizade ué. Então vai a merda.” Foram estas palavras que ela escreveu pra mim e logo foi procurar outro nick para teclar.

Fiquei receosa por esta criaturinha que, na verdade, eu nem sabia se era verdadeira ou não. Me dei conta que meu lado mãe e educadora seria capaz de atuar em qualquer espaço de quaisquer redes. Me dei conta de que o comprometimento, quando o temos naquilo que acreditamos, nos leva a ficar preocupados com o coletivo. Ali estava eu... pensando numa criatura, que poderia ser uma criança, mas que também poderia ser um idiota qualquer se passando por uma. Mas, não me importei muito com a segunda opção. Fiquei mesmo preocupada e a toda hora buscava visualizar o nick Juju.
Vinha aos meus pensamentos o rostinho de uma criança sozinha em casa, talvez por inúmeros fatores, e, que buscava estar com alguém para afugentar a solidão e/ou um medo. Eu, na minha preocupação, já estava elaborando toda uma conversa para ter com os alunos com os quais eu trabalhava, levando-lhes orientações sobre os riscos de espaços virtuais, sem que seus pais tivessem conhecimento. E, cada vez que eu via somente as respostas da Juju na tela, imaginava que quem pudesse estar no reservado conversando com ela, poderia ser uma pessoa desqualificada e, portanto, poderia estar dizendo coisas que certamente como mãe e educadora eu não gostaria que dissessem ao filho(a) meu – pelo menos não na idade que me parecia ter a Juju.
Engraçado é que a minha preocupação contagiou a muitas pessoas na sala. Estas, como eu, também buscavam a toda hora certificarem-se de que Juju estava em segurança na sala, todas conversavam com ela. Às vezes Juju era cortês com todos e outras vezes era muito atrevida.
Juju permaneceu durante horas na sala de bate-papo, era bem tarde (quase madrugada), quando ela resolveu sair da sala. Confesso, dei graças a Deus. Contudo, minha preocupação permaneceu, pois continuei pensando “e se ela for para outra sala? E se lá as pessoas não tiverem a paciência que nós tivemos? E se este nick for mesmo uma criança e, que esteja sozinha em casa?” – Meu Deus!... eu parecia que ia ter um troço com tantas perguntas sem respostas. Com tantas preocupações que me surgiam de fato, mas sem quaisquer fundamentações reais para justificar a minha angústia.

Era, então, hora de rever meu entendimento desse mundo paralelo – real no momento em que ali estamos, mas, e ao mesmo tempo irreal, quando surgimos da imaginação e dela extraímos comportamentos que espelham doses de nós mesmos, numa ânsia de sermos muitos entre muitos e podermos estar cercados de semelhantes. Aiiiii!... Que coisa mais doida isso! Este, é o preço que temos de pagar pelas mudanças que acontecem sem que estejamos tão preparados para enfrentá-las. Sem que estejamos por dentro do funcionamento dessas mudanças. Sem que saibamos como estamos situados em nós mesmos e o que isso pode acarretar no mundo exterior. Sem saber como lidar com tantas coisas diferentes e ao mesmo tempo de uma velocidade impressionante, como são as redes de comunicação on line. Mudanças necessárias, previstas pelo homem na organização das sociedades. Estudada passo a passo nas suas estruturas para que permaneçam avançando sempre e mais. Mas, a nossa essência e a nossa ânsia diante do desconhecido, nos leva a ter gestos e/ou atitudes impensadas, que podem originar conflitos, desgastes, perturbações, emoções tais, que não caiba em nós. Isso é perfeitamente possível no mundo virtual. No mundo onde o real e o irreal se confundem a todo momento. Onde o que não se vê, provoca sensações parecidas com o que se vê a todo momento. Seríamos então só essência? Estaríamos então revelando com os acontecimentos tecnológicos o que realmente somos e a mentira ficaria por conta do real? No mundo físico? Seriam irreais os conceitos plantados sobre o quê é e o quê não é real? Como responder a tudo isso? Como ativar em um momento o botão do real para se ter certeza de que o irreal não trará danos à nossa realidade, ao nosso dia-a-dia? Ao nosso tempo pensado depois que a tela disser “fazendo logoff”?

Eu, pessoa ligada e muito ligada às mudanças de comportamento, por tratar no plano real com adolescentes, começava a questionar toda uma forma de mudança que minha área de atuação (a Educação), na sua maioria, ainda deixava de lado – a comunicação virtual como realidade na vida das pessoas. Como um passo adiante para as atitudes de valores reais já desconectados das vidas do hoje, do agora. Como uma realidade sem volta e a cada dia mais e mais veloz, desacelerando velhos conceitos e acelerando outros, cujos caminhos são tantos, que muitos não conseguem atinar sobre suas possíveis verdades e consequências.

5 comentários:

  1. Parabéns menina pelo seu blog. Tenho ougulho em ser sua amiga.Você é dez! Consegue traduzir muito bem o que a gente pensa também. Muito agradecida por estas coisas todas que você escreve. Deus te abençoe!

    Mariana Veras

    ResponderExcluir
  2. Gostei muito do que você escreveu minha mana.Parabéns.Te gosto um tantão assimmmmm...(risos)

    Fabinho

    ResponderExcluir
  3. Olá...
    Agradecida pelo contato e pela divulgação do endereço do blog, Sônia.
    Parabéns também pela clareza de idéias e pela 'verbalização' de muitos sentimentos que afligem a virtualidade.
    ''Meu Deus, como somos frágeis''.
    Abraço.
    Claudia Ka (ACasaDasMilPortas)

    ResponderExcluir
  4. Abelhinha...nem preciso comentar...vc descreve perfeitamente oq passamos diariamente nas salas...temos todos os mesmos pensamentos, mas só vc conseguiu verbalizar tão claramente...só posso te dizer mais uma vez ...PARABÉNS!!!!

    Bjs

    Coração Vazio

    ResponderExcluir
  5. BOM DIA MEU AMOR!
    E PERDÃO, POR CONFIAR EM ALGUEM E FALAR DO MEU AMOR POR VC, NÃO SABIA QUE ELA SENTIA ALGO POR MIM.E AGORA ELA ESTA FAZENDO HORRORES COM VC.
    ENTRANDO NAS SALAS QE VC ESTA E MAGOANDO VC, BEM QUERO QE SAIBA QE JA TOMEI MINHAS PROVIDENCIAS, FALANDO COM O MARIDO DELA , FIQUEI SABENDO QE SE TRATA DE UMA PESSOA DOENTE.NÃO VAI MAIS IMPORTUNA-LA, ESTA EM UM HOSPITAL.QUE "DEUS ESTEJA SEMPRE COM VC , MEU AMOR, CONFIE EM MIM.UM GRANDE BEIJO

    ResponderExcluir