segunda-feira, 26 de janeiro de 2009

Amor e virtualidade...
O que é e como pode ser um namorado virtual? Qual a graça em ter um? Que loucura essa agora? E os afagos? E o olho no olho? E todas as brigas? Elas não são mais necessárias? Estando no mundo virtual, não pode haver ciúmes, então o ciúme, como descreve Caetano, ficou no “curtume”? A sombra dele dissipou-se totalmente? A humanidade está livre dele para sempre? – PÁRA ESTE BARCO QUE EU QUERO DESCER... SOCOOOOOOORRRRRRRROOOOOOO!...
Não, eu não queria pensar na possibilidade de que amar virtualmente tem o mesmo sabor do aqui e agora de corpo presente. E, no aqui e agora, a gente sente o calor do outro. Sente o cheiro. Vê as transformações no olhar... Está tete-a-tete. A gente pode reclamar da barba que espeta, quando está começando a crescer. Pode pedir pra deixar a barba crescer – é tão charmoso um homem com barba... A gente pode pedir que ele use um brinquinho pequenininho, e encarar, de frente, o olhar fulminante e machista respondendo a esta solicitação.
A gente pode fazer beicinho se ele não quiser ficar mais tempo. E vê-lo voltar da esquina só pra dar o último beijo. Diga-se de passagem, o último beijo ali do lado de fora da porta. E, muitos outros depois que a porta for fechada. Ah!... isso é bom demais pra ficar perdido na virtualidade. É doce demais pra perder o gosto na virtualidade. É furta-cor demais para ficar descolorido na virtualidade. Que loucura!...
Percebo, que muitas pessoas ficam na impessoalidade por medo de colocarem-se à vista, naquilo que realmente são - e, por isso escondem-se por detrás de um nickname. Contudo, fica muito claro a solidão em que se encontram, isso funciona como um facilitador para o envolvimento em emoções mais profundas. Acabando, muitas vezes, confundidas com paixões e amores

Eu havia arrumado amigas literalmente piradas, elas namoravam no virtual... E diziam estar apaixonadas... Elas agiam como namoradas mesmo. Contavam coisas de namorados. Deixavam escrito na tela mensagens de namorados. Eles (os pares) colavam música e ofereciam um ao outro com dedicatória de namorados...
Era piração o que eu estava presenciando, ou as coisas realmente haviam mudado tanto, que eu, num dado momento e, por estar correndo em outro sentido, havia perdido o bonde dessa história?!... O quê que é isso meu Deus???

Paixões, por si só, podem definir aspectos pessoais, mas não garantem tranquilidade a quem as tem, porque sabemos que as paixões são arroubos de momentos em que nos encontramos no auge da carência afetiva. E assim a solidão nestas Salas e em muitos sites, levam a essa confusão de sentimentos, que permeiam a vida de quem está sofrendo com a solidão.
Já, o amor, não pode nascer a partir daquilo que não conhecemos. Ama-se o que se conhece e o que se cultiva a cada gesto, a cada olhar, a cada cheiro, a cada palavra no calor de cada emoção, a cada dia... hora... minuto... segundo e em todas as suas frações. É verdade que amamos à distância, mas o que amamos à distância é justo o que já nos fez sentir a proximidade em muitos momentos das nossas vidas.
Amar o desconhecido, parece uma questão da necessidade de avaliação e revisitação a conceitos que fazemos dos nossos próprios atos. Assim como um estudo mais aprofundado sobre o que somos, fazemos e queremos da vida.

Na sala 4, era comum a brincadeira de dizer que a cada ritmo nós dançávamos todos juntos (claro, imaginariamente cada um a seu modo e no seu espaço real). Lógico, o ritmo de algumas, fazia com que meu corpo se inquietasse na cadeira, sempre. Às vezes eu me levantava e arriscava um movimento e outro. Aumentava o som e brincava sozinha diante do computador. Quando voltava à conversa, todos nós ríamos muito, pois uns tinham filhos que entravam na hora exata da loucura (no plano real) e perguntavam o que estava acontecendo. Outros acabavam tomando vinho demais e quando iam dançar, a cabeça rodava mais do que deveria – esses relatos sempre nos vinham como testemunhos (risos). Um dia uma das amigas relatou-nos que havia bebido muito vinho num churrasco e depois foi para o computador e entrou na sala, segundo ela, num desses momentos de loucura dançante, tudo começou a rodar e acabou com a cabeça no sanitário de tanto que passou mal. Rimos muito do episódio. Fiquei imaginando a cena. Ela nos relatava com detalhes todo o ocorrido...(risos) Mas o mais interessante era o dançar a dois... (risos) Havia isso... dançar a dois. Os passos comentados e os afagos também. Assim agiam os namorados virtuais.

As horas passavam e nem sentíamos. Cada um no seu espaço, na sua cidade, ou até mesmo seu país, e ligados a uma máquina que gerava uma vida diferente. Para muitos, o simples desligar dela, seria talvez o mesmo que a eutanásia... rs...

Mas, e voltando aos namoros virtuais, cada dia víamos crescer o namoro de uma das amigas da sala. Agora, as conversas saíam da sala para o MSN e/ou para as salas privadas. Eles sumiam por horas e horas. Quando retornavam, estavam cheios de gás para mais uma rodada de brincadeiras.
Particularmente, eu via este momento como sendo aquele em que chegamos do motel com os cabelos molhados ainda e com a cara de quem gastou todas as reservas de energias lá. Mas, que, para não dar motivos para alguém sacanear, faz de conta que ainda tem muita energia sobrando e muito fôlego – atitude comum dos freqüentadores de motéis, assim que voltam ao convívio da festa (risos).
Agora não se tratavam mais pelo nick, era “meu amor”. Faziam juras, que às vezes, escapulia do reservado e aparecia para todos na sala. Confesso, em alguns momentos, aquela emoção dos dois atingia também a mim. Contudo, e depois que eu saía da sala virtual, a realidade me fazia questionar tudo aquilo. Eu voltava então a ficar refletindo sobre esses sentimentos virtuais. Isso me chamou tanto a atenção, que comecei a buscar informações plausíveis para que pudesse entender situações como esta.
Na própria sala, comecei meu trabalho de investigação sobre relacionamentos virtuais.
As histórias eram as mais variadas possíveis. Havia pessoas nesta sala que começaram a vida a dois, no plano real, ali. E, passados alguns anos de convivência real, continuavam freqüentando a sala. Elas contavam com o tudo havia começado; como foram seus dias de angústia antes de se conhecerem no real; como suas expectativas eram até que se conheceram; como eram ridicularizados por muitas pessoas e toda a luta contra a impessoalidade e as dúvidas surgidas naqueles momentos de profundo afeto.
Estes relatos me faziam voltar ao pensamento das cartas escritas e trocadas em tempos idos, por seus amantes... Me faziam buscar um entendimento mais apurado sobre como podemos ser diante dessa emoção que nos vem sem que necessariamente precisemos estar diante do objeto que nos provoca tal reação. Me levavam a prestar mais atenção em mim, com relação ao fato de começar a chamar de “amigos” pessoas que eu jamais vi... Mas que travavam comigo conversações como se nos conhecêssemos de longo tempo. Interessante esta convivência.

Mas eu relutava, resistia diante da possibilidade, que me diziam, de poder haver uma relação de afeto mais profunda e direcionada na virtualidade. E, assim como eu, a sala tinha outros incrédulos. Trocávamos muitas conversas a respeito e compactuávamos idéias a respeito. De certa forma, eu ficava entre o acreditar e o não acreditar nos romances e nas opiniões dos incrédulos, já que alguns haviam passado pelo processo. E, por terem sofrido decepções, deixaram de acreditar nessas possibilidades de amor virtual. Portanto, minhas referências de apoio (risos) nem eram tão confiáveis assim.
Estar no escuro, pode oferecer riscos inerentes ao que somos e, num momento desavisado da emoção, podemos estar transferindo para àquela pessoa idealizada, não àquela que temos à mão... ao alcance, todos os nossos sonhos reais. Isso pode acabar ferindo muito os envolvidos no processo.

Certa vez, conversando com uma professora muito amiga, isso no plano real, e contando sobre tudo isso das salas, ela relatou-me uma experiência vivida em família, que muito me fez pensar. Contou-me que estava vivendo dois grandes dramas, um com a ex-sogra que se utilizava das salas virtuais para depreciá-la diante dos filhos, que freqüentavam salas de jovens. E o outro drama, com sua irmã que havia tido complicações no casamento, por haver se apaixonado por outra pessoa numa sala virtual e largado tudo para acompanhar esta paixão em outro país. Claro, a família se desfez e sofre até hoje. Perguntei-lhe quanto tempo durou ou se ainda estavam juntos o casal. Ela confidenciou-me que a irmã havia vivido uma relação de contos de fada, mas, que, como todo conto de fadas tem também uma bruxa, esta se encarregou de horrorizar a relação deles. A irmã dela então voltou para casa e tenta reconstruir sua vida junto ao marido e aos filhos. Mas minha amiga à medida que me contava, deixava transparecer sua preocupação nesta relação tão abalada por este romance virtual.

Eu pensava: amor e virtualidade não sabem um do outro. Amor sabe de si, basta-se. É terra de habitação singela, bonita, perfeita... tem cheiro de vida!
Virtualidade nada sabe profundamente do que vai no íntimo de cada um. É terra de ninguém e de todos e tudo simultâneamente.
Mentiras das mais grotescas às mais sofisticadas estão presentes na rede de comunicação on line. Abusa-se daquilo que não se é, para ser aceito com perfis desejáveis por outro que também mente, mas que igualmente necessita ser aceito. E, nesta relação, não pode haver espaço para o amor.
O amor aceita, cuida, guarda, tem zêlo... Tem uma música do Chico Buarque e do Edu Lobo, que em certo trecho diz:

"Vivia a te buscar porque pensando em ti
Corria contra o tempo
Eu descartava os dias em que não te vi
Como de um filme
Ação que não valeu..." .
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Contudo...
Conheci uma história que passou do virtual para o real e, que ainda hoje é motivo de grande felicidade para os dois. Esses eram casados e felizes com seus parceiros, até que se conheceram numa sala de bate-papo. Ao se conhecerem (risos) descobriram que poderiam ser mais felizes do que até então acreditavam que eram. Assim, partiram para essa busca e resolveram assumir publicamente esta relação. Desfizeram seus antigos relacionamentos e foram viver esta nova possibilidade de poderem ser felizes. Deu certo! Ainda hoje, passados já dez anos, reconhecem-se como tendo sido feitos um para o outro. São felizes, muito felizes!!! Bacana esta história! Hoje os conheço pessoalmente.

Há na virtualidade casos que a gente nem imagina como podem sobreviver. Há histórias que parecem contos de fadas. Há histórias que trazem horror ao ficarmos sabendo e há histórias que estão sendo construídas neste exato momento. Talvez, uma dessas possa vir a ser a minha ou a sua história... de amor ou de terror (risos). Mas, o que parece tão previsível na minha incredulidade, pode vir a ser imprevisível na minha condição de humano neste espaço real tido como sendo irreal. (risos)

“Há mais mistérios entre o céu e a terra, do sonha a nossa vã filosofia."
“Nós somos feitos do tecido de que são feitos os nossos sonhos.” (Shakspeare)

4 comentários:

  1. Parabéns! Parabéns! Parabéns!
    Estou encantada com este seu texto. Você sabe o quanto de admiração eu tenho pelo que você escreve e descreve. Você realmente consegue isso. Parabéns! Parabéns e parabéns!
    Obrigada por me manter no seu círculo de amizades.
    Sucesso!

    Kátia Hernani

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  2. Boa noite! Tive a feliz oportunidade de visitar o seu BLOG e você soube muito bem, adotando uma linguagem simples, traduzir essa " magia" que é o mundo virtual....Ele encanta as mais sutís carências, sejam elas afetivas ou até mesmo materiais. Aqui, conhecemos as pessoas da maneira mais extraordinária possível: " De dentro pra fora"...Assim, o conhecimento da " alma" aproxima muito mais, que apenas o conhecimento físico do outro; o que comummente acontece no plano real. E , se assim tbm o fosse em nossa vida real, talvez cometessêmos menos erros, pq daríamos menos importância ao apelo físico....Parabéns pela idéia que somente alguém com uma rara sensibilidade, seria capaz de introjetar experiências tão marcantes de um mundo que seria aquele desejado por quase todos....Um abraço, e conte comigo!

    M sem aliança...

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  3. Demorei a visitar seu Blog. Arrependido. Muito arrependido, porque fiquei longe de tantas palavras que trazem as definições mais acertadas do que é a relação na virtualidade.
    Fui muito apaixonado por uma mulher que conheci numa sala. Tudo isso é bem verdade. Vou esperar muito ansioso pelos próximos artigos.
    Obrigado Suave, você é uma mulher fantástica!
    Tem vaga nesse coração? Sou candidato... hehehee
    Beijo, linda!

    Antonio (Estou Aqui - meu nick)

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  4. É muito interessante a maneira como você vê a relação virtual. Por não ser muito entendida e por não ter o hábito de frequentar chats, nunca pensei que pudesse ser dessa maneira. Gostei de tudo que você escreveu e quero continuar a ler mais. Cheguei até o seu Blog por indicação de uma amiga que frequenta chats. Pnsei que fosse encontrar um monte de besteiras e fofocas escritas. Estou surpresa realmente. Gostei muito. Voltarei sempre e vou recomendar aos amigos.

    Martha

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